A Região Oeste do Distrito Federal tem uma população de meio milhão de pessoas, das quais 7000 mulheres engravidam a cada ano. Assim como em muitas partes do mundo, a sífilis é um grande desafio de saúde pública na Região: em 2021, houve 1654 casos de sífilis congênita para cada 100 000 bebês nascidos vivos. Isso é 33 vezes maior do que a meta da OMS de 50 casos por 100 000 nascidos vivos para atingir a eliminação da transmissão vertical, também conhecida como transmissão de mãe para filho, da sífilis como um problema de saúde pública.
Em 2021, uma avaliação revelou que, embora a cobertura das consultas pré-natais fosse alta, com 48% das gestantes tendo tido pelo menos 6 consultas (1), apenas 68% das gestantes que iniciaram o pré-natal foram testadas para sífilis e apenas 46% das diagnosticadas com sífilis receberam tratamento adequado (2) (figura 1). As metas mundiais para cobertura de testes e tratamento para sífilis são ambas ≥95%.
Figura 1. Progresso na cascata de cuidados da sífilis na gravidez de 2021 e 2023
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Em resposta a esses desafios, gestores, profissionais de saúde e a equipe de vigilância epidemiológica uniram forças e desenvolveram um plano de ação local abrangente para enfrentar a sífilis congênita. A implementação bem-sucedida do plano reduziu a taxa de sífilis congênita em 37% em apenas 2 anos, de 1654 para 1042 por 100 000 nascidos vivos.
“Todos estavam determinados a melhorar a qualidade do atendimento e atingir os padrões de eliminação, apesar das altas vulnerabilidades sociais na região, como a pobreza e os altos índices de violência”, disse André Luiz de Queiroz, Superintendente da Região de Saúde Oeste do Distrito Federal.
O plano de ação da Região visa melhorar a governança e aumentar a qualidade dos serviços pré-natais na atenção primária e nas maternidades obtidos pelo monitoramento eficaz de dados. Para isto, uma ferramenta digital de fácil utilização foi desenvolvida pela própria equipe e implantada para rastrear, em tempo real, o cuidado prestado a cada uma das gestantes que iniciaram o pré-natal. Uma das funções da ferramenta é registrar a testagem para sífilis, os resultados dos testes e o histórico de tratamento, incluindo os títulos dos testes não-treponêmicos usados para avaliar o sucesso do tratamento. Ela também identifica as gestantes que precisam retomar o tratamento e, em breve, irá monitorar a testagem nos parceiros sexuais.
O plano também inclui outras ações críticas, entre elas:
- acrescentar às tarefas do atual Comitê de Atenção Primária à Saúde o papel de supervisionar a continuidade dos cuidados de todas as gestantes, além de investigar todos os casos de sífilis congênita para corrigir falhas na prestação de serviços;
- envolver a equipe do laboratório local para garantir uma rápida testagem e retorno dos resultados, bem como ajudar a equipe de vigilância epidemiológica a identificar e corrigir subnotificações ou notificações de casos de sífilis maternal incorretas;
- capacitar os profissionais de saúde com protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas nacionais atualizadas para o diagnóstico e o tratamento da sífilis nas unidades básicas de saúde, assim como melhorar o apoio com visitas de supervisão e o desenvolvimento de procedimentos operacionais padrão de fácil uso;
- oferecer testes rápidos e tratamento gratuitos para sífilis, HIV e hepatites virais B e C, em todos os serviços de saúde e para todos, independentemente se gestante ou não, bem como preservativos e gel lubrificante
- oferecer o mesmo pacote de serviços na unidade móvel usada pelo programa de vacinação para diminuir o estigma e a discriminação relacionados à testagem para infecções sexualmente transmissíveis (IST); e
- fortalecer o sistema de referência para as crianças expostas à sífilis materna.
Em reconhecimento a esses avanços, a Região Oeste do Distrito Federal recebeu o Selo Prata pela eliminação da transmissão vertical da sífilis pelo Distrito Federal e a Medalha de Prata de Boas Práticas pelo Ministério da Saúde do Brasil pela eliminação da transmissão vertical do HIV como um problema de saúde pública.
“Essa experiência brasileira pode servir de exemplo e inspiração para outros países que enfrentam desafios semelhantes, especialmente em relação à sífilis materna e congênita. Ela demonstra como a vontade política, a gestão estratégica baseada em evidência e profissionais de saúde comprometidos podem melhorar concretamente a vida das pessoas”, disse a Dra. Meg Doherty, Diretora dos Programas Globais de HIV, Hepatite e Infecções Sexualmente Transmissíveis da OMS.
A OMS e a comunidade mundial estão comprometidas com a estratégia da tripla eliminação da transmissão vertical do HIV, da sífilis e da hepatite B. Para mais informações e conhecer outras experiências, visite o site da OMS sobre a iniciativa de tripla eliminação.
Esta experiência de sucesso foi apresentada no encontro de colaboração dos países de língua portuguesa em março de 2024, e inspirou participantes de outros países a desenvolver e implementar planos de ação semelhantes.
Notas
- No Brasil, o indicador de cobertura do pré-natal considera a ocorrência pelo menos seis consultas em vez de uma única consulta, conforme adotado pela OMS para o processo de validação mundial.
- O tratamento adequado da sífilis materna para prevenir a sífilis congênita consiste em uma a três injeções de penicilina benzatínica G iniciadas pelo menos 30 dias antes do parto, com o número de doses variando de acordo com o estágio da infecção.